quarta-feira, 15 de junho de 2011

GUSTAV MAHLER (1860-1911) - Parte V

Depois de compor sua Quinta Sinfonia, Mahler entrou no período que é identificado como Rückert, no qual compôs um ciclo de lieder assim chamado, de tons pessimistas, fúnebres, ainda que belíssimos.
Sua Sexta Sinfonia, chamada “Trágica”, é densa, classicamente estruturada em quatro movimentos, de temperamento similar aos Rückert Lieder.
O primeiro movimento contrasta uma marcha implacável com um tema terno, que Mahler identificava como o “tema de Alma”, em referência à sua esposa.
Tradicionalmente o segundo movimento traz um scherzo, lúgubre, que amplia a sensação de catástrofe iminente.
O terceiro é um andante, de grande beleza, que faz um grande contraponto ao imenso finale, que originalmente trazia em sua coda três batidas de tímpanos, interpretadas como golpes do destino. Curiosamente, logo depois da estréia, o compositor foi atingido por tragédias pessoais: a morte da filha mais velha, a demissão da Ópera Imperial e o diagnóstico de sua grave doença cardíaca.
Considera-se a Sexta como a principal composição de Mahler, sua sinfonia mais bem acabada e intelectualmente desafiadora, clássica quanto à forma, profética quanto ao conteúdo. Para o compositor austríaco e discípulo de Mahler, Alban Berg, era a única Sexta, apesar da Pastoral, de Beethoven. Não muitos anos depois a Europa seria devastada pela 1ª Guerra Mundial e o Império Austro-Húngaro extinto.
John Barbirolli fez um registro que é tido como clássico, à frente da Orquestra Filarmônica de Londres(EMI). O maestro adota tempos em geral amplos, alcançando dimensões não somente trágicas, mas devastadoramente catastróficas. Diferente do usual, o Andante vem em segundo lugar, colocando o scherzo em terceiro, prática que alguns, como Abbado, vêm difundindo recentemente, segundo se acredita ser a intenção original do compositor.
Leonard Bernstein deixou registros expressivos, com a Filarmônica de Nova York (Sony) e Filarmônica de Viena (DG), assim como Kubelik, Abbado, Mariss Jansons, dentre outros.
Tecnicamente a versão de Karajan (DG) é insuperável, equilibrando excelência sonora com uma concepção estrutural memorável, talvez o melhor registro existente, especialmente no Andante, onde o regente evita o melodrama sem prejuízo do lirismo e da sutileza instrumental.
Não há espaço aqui para a esperança ou alegria de viver que se fazem presentes em muitos trechos das sinfonias anteriores. Nenhum outro compositor pós-Mahler conseguiu expor de maneira tão contundente as ambigüidades do homem moderno, cujo distanciamento de Deus e suas tendências materialistas levou a tragédias tão gritantes como as duas guerras mundiais e vários outros conflitos mortais em várias partes do mundo.
Diz Michael Kennedy em sua biografia de Mahler que Bruckner chegava até Deus com facilidade, Richard Strauss nunca se preocupou em buscá-lo e Mahler prosseguiu buscando-o até o último momento de sua vida.
Essa busca terá reflexos nas obras seguintes, especialmente na Oitava Sinfonia, que, em tempo oportuno, abordaremos aqui.
JHC
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sexta-feira, 10 de junho de 2011

GUSTAV MAHLER (1860-1911) - Parte IV

Dando prosseguimento a este breve comentário sobre Gustav Mahler, compositor austríaco nascido na Boêmia, cujo centenário de morte é celebrado este ano, adentramos em seu período intermediário, quando o compositor buscou inspiração em outras fontes que não o ciclo de poemas Das Knaben Wunderhorn.
Com a Quinta Sinfonia Mahler atinge um dos pontos culminantes de sua carreira. É a mais tradicional quanto ao conteúdo, embora abra mão de cinco movimentos, divididos em 3 partes, que Mario Henrique Simonsen, em seus saudosos artigos para a revista VEJA, costumava descrever como uma jornada partindo da mais profunda depressão para a mais exaltada euforia, referindo-se aos contrastes marcantes que o ouvinte experimenta do primeiro movimento ao último.
A Parte I engloba os dois movimentos iniciais. O primeiro movimento, Marcha Fúnebre, a ser executado como uma procissão, estabelece o padrão da sinfonia. Um tema melancólico e sombrio alterna-se com outro mais dinâmico e igualmente sombrio. Funciona como uma longa introdução lenta à sinfonia.
O segundo inicia-se no mesmo tom do final do anterior trazendo a indicação “com a maior veemência”. É de grande efeito dramático, enérgico e ainda mais ameaçador que a frase predecessora. O orquestrador Mahler aqui põe algumas dificuldades de execução que exigem tudo o que os músicos podem fazer com seus instrumentos. Suas fanfarras e ostinatos não resolvidos abrem espaço para o desenvolvimento subseqüente.
Depois de dois movimentos desesperançosos, na Parte II algumas luzes começam a brilhar. O Scherzo é a melhor frase sinfônica que Mahler escreveu. Não deixa de ser sombrio. A obstinação esboçada nas duas primeiras frases dá lugar a uma música ainda mais obsessiva, que usa um tema que lembra uma antiga valsa. Um solo de trompa tenta romper a escuridão emocional, mas sempre esbarra nos ritmos implacáveis da orquestra. Efeitos orquestrais arrebatadores destacam-se aqui e ali e a coda traz um espetacular colorido orquestral, embora não resolva a tensão presente desde os primeiros compassos.
A Parte III é composta pelos dois últimos movimentos. O Adagietto surge como um idílio, onde apenas as cordas e uma harpa oferecem algo como um consolo, até mesmo esperança. Esta frase é uma favorita do público e muitas vezes é executada sozinha. Em 1975 o diretor italiano Lucchino Visconti a utilizou como tema musical do filme Morte em Veneza, cuja trama inspirava-se parcialmente na vida de Mahler.
Do lento e elegíaco Adagietto a sinfonia salta para o Rondó-Finale,um final radiante, alegre, até mesmo vibrante. Os temas são eletrizantes, rigorosamente desenvolvidos, como manda a tradição germânica. O tom eufórico deste movimento encerra com maestria uma das maiores obras-primas musicais do século XX, hoje a sinfonia mais executada e gravada de Mahler, fato plenamente justificado pela qualidade da composição. Foi a última sinfonia de Mahler em que o otimismo e a esperança são espontâneos e sinceros. Nas obras seguintes não haveria lugar para tais sentimentos.
Das gravações disponíveis citamos a de Barbirolli, com a Filarmônica de Londres(EMI), Bruno Walter, com a Filarmônica de Nova York (Sony), Georg Solti, com a Sinfônica de Chicago e Sinfônica de Londres (Decca), Claudio Abbado, com a Sinfônica de Chicago e outra com a Filarmônica de Berlim(ambas pela DG) ou Simon Rattle, também com a Filarmônica de Berlim(EMI). Todas elas são excepcionais sob qualquer aspecto.
Destacamos, dentre todas elas, duas de valor inestimável: a de Herbert Von Karajan (DG), que extrai da Filarmônica de Berlim uma execução radiante, de incomparável virtuosismo orquestral e inesgotável imaginação por parte do maestro; finalmente, a de Leonard Bernstein, regendo a Filarmônica de Viena, naquela que talvez seja sua maior realização no repertório mahleriano. Seu virtuosismo instrumental não é menor que o de Karajan e conta com uma orquestra bastante familiarizada com esta obra, gravada com uma competência acima de qualquer elogio pelos engenheiros da Deutsche Grammophon. Os contrastes emocionais são explorados como em nenhum outro lugar.
JHC
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segunda-feira, 6 de junho de 2011

GUSTAV MAHLER (1860-1911) - Parte III


Após a segunda sinfonia, a carreira de Mahler, tanto como regente de orquestra como de compositor, dá um salto qualitativo, com obras que não só resumem os estilos anteriores como também antecipam, em décadas, o desenvolvimento da música erudita no século XX.
Neste ponto de sua vida, no início da última década do século XIX, Mahler era famoso principalmente como regente e em meados da década foi contratado como diretor musical da então Ópera Imperial de Viena, o cargo musical de maior prestígio da época, e, por conseqüência, da Orquestra Filarmônica de Viena, já no topo do ranking das maiores e melhores orquestras do mundo (naquele tempo só as orquestras de Berlim e Amsterdã eram concorrentes para os vienenses, situação que permanece praticamente inalterada neste início de século XXI).
Sendo um cargo público, subordinado à casa imperial austríaca, Mahler submeteu-se ao batismo católico-romano para estar em condições legais de assumir, uma vez que o catolicismo romano era a religião oficial do Império Austro-Húngaro, portanto os funcionários públicos eram obrigados a confessarem a religião estatal, prática esta ainda presente em diversos países, principalmente muçulmanos.
Durante sua gestão, a reputação destas duas formações atingiu seu ponto mais elevado, com representações consideradas até hoje como insuperáveis das óperas maduras de Mozart, Wagner e alguns outros mestres do palco.
No campo da execução da música sinfônica, chegou-se próximo da perfeição em Beethoven, Mozart, Haydn, Schubert, Brahms e Schumann.
Mahler produziu reorquestrações das sinfonias de Beethoven e Schumann, adaptando a sonoridade para o tamanho que as formações orquestrais tinham alcançado ao final do período romântico. Esses arranjos dividiram as opiniões dos eruditos, alguns as recebendo bem, argumentando que o próprio Beethoven aprovaria, uma vez que aumentava as forças instrumentais empregadas à medida que compunha, enquanto outros as têm como adulterações. Só o tempo mostrará quem tem razão.
A Ópera Imperial consumia praticamente todo o tempo de Mahler, que aproveitava as férias de verão para colocar na pauta musical suas idéias.
A Terceira Sinfonia surgiu neste contexto. É uma extensa obra em seis movimentos, que durante muito tempo foi a mais longa sinfonia a fazer parte do repertório. Originalmente eram sete os movimentos, mas o último foi recolocado como o final da sinfonia seguinte.
O primeiro movimento estende-se por meia hora ou mais. Nem de longe tem a organização estrutural das duas sinfonias anteriores, mas isso não importa muito. O brilho orquestral é extasiante e o movimento desenvolve-se de forma satisfatória, de forma que a duração é plenamente justificada pela riqueza de idéias musicais.
O segundo e o terceiro movimentos são scherzos estilizados, ora líricos, ora agitados. Novamente a rica instrumentação solta faíscas.
O quarto é um coro de meninos, que cantam um Wunderhorn Lieder.
O quinto é para soprano e orquestra, uma musicalização de um texto de Nietsche. O texto é inexpressivo, mas a música tem lá suas qualidades.
O finale é como um hino instrumental, de grande inspiração emocional e temática, uma oração sem palavras.
A estréia em Krefeld, Alemanha, foi em 1902, durante a festa anual da Sociedade Geral Alemã de Música, e foi um triunfo para Mahler, o primeiro ponto culminante de sua carreira.
Já citamos alguns dos grandes regentes mahlerianos do século XX. Destes destacam-se nesta sinfonia Sir John Barbirolli e Jascha Horenstein. Barbirolli deixou um registro antológico com a Sinfônica da BBC. Horenstein (1970, hoje fora de catálogo) atingiu aquele que talvez seja o marco definitivo da interpretação desta sinfonia, com uma execução imaculada da Orquestra Sinfônica de Londres e de dame Janet Baker como a soprano solista. Estas duas gravações formam o padrão pelo qual as demais são avaliadas.
As demais incluem grandes gravações por Bernstein, principalmente a primeira, com a Filarmônica de Nova York (Sony), cujas alturas não foram igualadas quando da regravação nos anos 80(DG). Claudio Abbado também tem dois excelentes registros, feitos em Viena (com a filarmônica local) e Londres (com a Filarmônica de Berlim, em 2002, quando da participação dos berlinenses nos Proms Concerts). Recomendamos também o álbum de Riccardo Chailly, com a Concertgebouw, verdadeiro desfilar de virtuosismo instrumental e vocal, sem melodrama ou implicações extra-musicais, que muitas vezes atrapalham as outras gravações.
A sinfonia seguinte, a Quarta, em sol maior, foi elaborada a partir do movimento descartado da terceira, que seria o último. É uma sinfonia composta de trás pra frente, algo incomum. Soa diferente das obras sinfônicas anteriores pela sutileza na invenção melódica e na instrumentação.
Os dois primeiros movimentos têm andamento moderado, onde a única percussão utilizada é a de sinos de trenó, fazendo a composição lembrar certas canções infantis.
O terceiro movimento, Ruhevoll, lento em alemão, é como uma canção de ninar estilizada, onde o consolo é apenas desejado, sem jamais ser alcançado. É similar ao finale da terceira sinfonia, embora menos radiante, como um presságio de dores futuras.
O quarto e último foi o primeiro a ser composto, originalmente como o final da terceira. É uma canção Wunderhorn, sobre o que seria a vida no céu, segundo a concepção católica popular. O compositor pede que seja cantada com expressão de alegria infantil, ressaltada pelo sutil acompanhamento orquestral.
A impressão que deixa é como a saudade de experiências não vividas, a dor por oportunidades não aproveitadas, ou seja, sentimentos que estão longe de serem infantis. É uma das obras mais características de Mahler, a primeira a atingir certa popularidade, ainda nos anos 20, e certamente sua obra mais “leve”.
A variedade de gravações desta sinfonia é imensa, a mais gravada junto com a primeira e quinta sinfonias. Szell, Horenstein, Barbirolli, Benjamin Britten, Walter e Mengelberg são os favoritos da crítica, aos quais podem ser adicionadas as gravações de Bernstein (Sony), Maazel(Sony) e Klaus Tennstedt(EMI), todas elas de virtudes musicais abundantes.
Saindo um pouco das opiniões dos críticos, gostaríamos de incluir, também, a gravação de Herbert Von Karajan (DG), regendo a Filarmônica de Berlim, com a mezzo-soprano Edith Mathis. É insuperável do ponto de vista instrumental, com um soberbo controle do andamento musical, principalmente no movimento lento, aliado à transparência da execução. Karajan nos entrega um Mahler verdadeiramente sinfônico, sem implicações filosóficas ou mesmo teológicas que se fazem presentes em muitas outras gravações.
Até aqui as obras mahlerianas costumam ser delimitadas pelo que os músicos chamam de "período wunderhorn", lembrando arte popular das comunidades germânicas do Império Austro-Húngaro, em referência à coleção de poemas que serve de base para vários dos movimentos das quatro primeiras sinfonias, que dará lugar a elementos mais pessimistas a partir da sinfonia seguinte.
JHC
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sexta-feira, 3 de junho de 2011

GUSTAV MAHLER (1860-1911) - Parte II

No post anterior, comecei a explorar um pouco a vida e a obra do compositor austríaco Gustav Mahler, cujo centenário de morte ocorreu no último dia 18 de maio. Estou usando o que escrevi como esboço para um ensaio mais amplo, onde registro minhas impressões e as da crítica sobre as sinfonias e, eventualmente, os ciclos de canções.
Para alguns pode parecer estranho que este blog não tenha um foco específico, tipo só teologia ou assuntos afins, mas é que gosto e cultivo muitas disciplinas, como os interessados podem ver em meu perfil.
Sobre Mahler:
O trabalho na Segunda Sinfonia começou logo após a conclusão da primeira versão da Sinfonia Nº 1. Os esforços compositivos estenderam-se de 1888 a 1894. É bastante perceptível o progresso na capacidade criadora do grande compositor.
Mais uma vez há uma divisão em cinco movimentos, cada um bem diverso dos demais. A primeira frase é uma marcha fúnebre, que soa como uma continuação direta do finale da Primeira Sinfonia. A segunda é um andante à maneira de Schubert, embora sem a riqueza melódica deste. O terceiro é um scherzo estilizado, de grande virtuosismo instrumental. O quarto é uma Canção Wunderhorn, Urlicht (Luz Original, em alemão), de clara natureza religiosa. O quinto é uma imensa frase de mais de 30 minutos de duração, para soprano, mezzo-soprano e um grande coro. O texto é baseado em uma ode do poeta romântico Klopstock, sobre a idéia de ressurreição, embora mais filosófica que religiosa.
Vale ressaltar que, ao contrário do que podemos imaginar inicialmente, o uso de vozes solistas e coros em suas sinfonias deve-se mais ao modelo herdado das missas de Bruckner do que à Nona Sinfonia de Beethoven.
A complexidade desta composição, e das outras sinfonias que vieram em seguida, estabeleceu a realidade onde se fazem necessárias várias audições de uma obra para que o  público se habitue à música e, com o tempo e a audição repetida, possa fazer uma melhor apreciação. Nos tempos anteriores ao registro fonográfico os concertos de obras de Mahler não eram tão freqüentes como hoje, daí a pouca, ou nenhuma, popularidade de suas sinfonias antes do surgimento das técnicas de gravação mais desenvolvidas, como o disco long-play.
 Essa situação piorou com ascensão dos nazistas ao poder na Alemanha e, em seguida, na Áustria, banindo as composições do judeu Mahler do repertório, isso em um tempo que as outras nações praticamente não o conheciam, o que poderia levar ao esquecimento definitivo.
A partir do final dos anos 30 surgiram as primeiras gravações, ainda em 48 RPM, como, por exemplo, a execução da Nona Sinfonia por Bruno Walter à frente da Filarmônica de Viena, em 1938, poucas semanas antes da anexação da Áustria pela Alemanha nazista.  No início dos anos 50 já havia um significativo número de gravações, o que impulsionou o interesse quase febril que pode ser notado nos anos 60, com pioneiros ciclos completos realizados por Leonard Bernstein e Rafael Kubelik, ainda hoje contados entre as maiores gravações de obras de Gustav Mahler.
 Merecem menção também as realizações discográficas de Sir John Barbirolli e Otto Klemperer, maestros entusiastas de Mahler, que muito contribuíram para a difusão de suas obras. Klemperer foi um defensor de primeira hora. Barbirolli, a exemplo de Karajan, descobriu Mahler em seus últimos vinte anos de vida, é considerado o introdutor destas sinfonias no repertório da Filarmônica de Berlim, que até os anos 60 era indiferente, até mesmo hostil, à música de Mahler, situação que só mudou sob a direção de Claudio Abbado, cujo sucessor, Simon Rattle, consolidou neste início de século XXI em concertos e gravações aclamados da Quinta, Nona e Décimas Sinfonias.
Alguns consideram a Sinfonia Nº 2 como a obra-prima de Mahler, uma síntese bem-acabada de seu método composicional, mesclando pura música instrumental com partes vocais à maneira de suas canções. Como já destacado anteriormente, as exigências técnicas são grandes e músicos menos preparados correm o risco de naufragarem numa execução desta sinfonia.
Das gravações disponíveis a mais em voga é a de Otto Klemperer, regendo a Orquestra da Radiodifusão Bávara(EMI, 1967). Klemperer, que acreditava ser esta a obra de Mahler que permaneceria, isto numa época que o mundo musical praticamente ignorava o compositor austríaco, também legou outro registro antológico com a Philharmonia Orchestra, de Londres (EMI,1961). São realizações estupendas, mas, que, em nossa opinião, são ultrapassadas pela versão de Zubin Mehta à frente da Orquestra Filarmônica de Viena (Decca, 1975), de extraordinária qualidade, tanto da enérgica e precisa regência quanto pela excelência do canto, com as solistas Christa Ludwig e Illeana Cotrubas, um inspirado coro da Ópera de Viena e uma vibrante execução orquestral, qualidades que reputamos como insuperáveis.
Mas, em se tratando de Mahler, temos sempre de destacar que nenhum maestro, cantor ou orquestra consegue exaurir a composição. Assim há um bom número de gravações que primam pela competência e bom gosto, tais como as de Bernstein(DG, Sony), Simon Rattle(EMI), Bernard Haitink(Philips), Bruno Walter(Sony), Claudio Abbado(DG), Pierre Boulez(DG) e Leonard Slatkin(Telarc)
J.H.C.
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quinta-feira, 2 de junho de 2011

GUSTAV MAHLER (1860-1911) - Parte I

Sou ouvinte de música erudita (ou clássica, termo mais comum, embora nem sempre exato) desde a adolescência, influenciado pelas partituras musicais para cinema de John Williams (Guerra nas Estrelas, Superman) e Jerry Goldsmith (Jornada nas Estrelas - O Filme), as quais eu cantarolava tão logo as ouvia, seja nos filmes, ou nos anúncios de TV destes mesmos filmes. Voltarei a estes princípios em breve.
Com o passar dos anos me interessei particularmente por dois compositores que, exceto Beethoven, eu mais escuto: Anton Bruckner (1824-1896) e Gustav Mahler (1860-1911). Sobre este último discorrerei neste espaço, falando um pouco da obra e de seus principais intérpretes.
A história da música é pródiga em episódios onde o reconhecimento só vem para um compositor após sua morte. Em alguns casos, bem depois. Podemos citar como exemplos Johann Sebastian Bach, Franz Schubert e Anton Bruckner, que, não por acaso, foi professor (embora não formalmente) de Mahler, objeto da presente reflexão.
Gustav Mahler nasceu na Boemia, em Kalist, uma aldeota hoje localizada em território húngaro. Era de família judia, situação que o levou a considerar a si mesmo três vezes apátrida: como boêmio na Áustria, como austríaco na Alemanha e, finalmente, como judeu no mundo.
Começou cedo os estudos musicais e ainda jovem regia óperas em teatros menores dentro do império austro-húngaro. Foi nomeado diretor da Ópera de Budapeste, transferindo-se pouco tempo depois para Hamburgo, para exercer o mesmo cargo. Neste ponto sua reputação como regente já estava em plena ascensão. Era exigente, perfeccionista, com explosões de intolerância quando contrariado por músicos ou cantores, os quais não hesitava em demitir sumariamente.
O cenário musical de sua época é de transição. O primeiro romantismo de Beethoven, Schubert e Schumann pertence ao passado enquanto os dramas musicais de Wagner e sua filosofia de “obra de arte total” consolidam-se na Alemanha e na França. Liszt está idoso, sendo venerado em toda a Europa. Berlioz falece sem ter sido reconhecido. Todos estes personagens têm uma influência decisiva nas concepções musicais de Mahler, quer na regência, quer na técnica composicional, aos quais Bruckner se somará.
Como compositor, escreveu na juventude alguma música de câmara, hoje de interesse apenas histórico. Quando descobriu o ciclo de poemas DES KNABEN WUNDERHORN (A cornucópia mágica do menino, em alemão) seu estilo começou a amadurecer. Musicou vários dos poemas, conseguindo simular as características da música popular germânica, ao ponto de suas composições serem confundidas com a autêntica música popular daquela cultura.
Suas sinfonias e canções são caracterizadas por grandes contrastes emocionais e estruturais, como em sua quinta sinfonia, que se inicia com uma marcha fúnebre desolada e se encerra com um finale de afirmação e júbilo.
Mahler é um dos compositores mais desafiadores do repertório, pois exige uma grande imaginação musical por parte dos maestros e orquestras. Nomes consagrados do meio musical, como o maestro alemão Wilhelm Furtwängler(1886-1954), considerado o maior regente do século XX, não se dispuseram a reger suas obras. Herbert Von Karajan(1908-1989),em muitos aspectos o sucessor de Furtwängler como maior maestro do mundo, só em seus últimos vinte anos regeu regularmente algumas das sinfonias e os ciclos de canções.
Nos dias de hoje execuções bem realizadas de suas obras são suficientes para alavancar a fama de qualquer regente ou orquestra, como é o caso de Sir Simon Rattle, britânico e atual diretor da Filarmônica de Berlim, que durante 18 anos foi titular da Sinfônica da Cidade de Birmingham, elevando-a ao topo das grandes orquestras mundiais, e do venezuelano Gustavo Dudamel, regente da Orquestra Jovem Simon Bolívar, da Venezuela, que, com menos de 30 anos se impõe como uma das maiores revelações da interpretação de música erudita, atualmente diretor da Filarmônica de Los Angeles e regente convidado de algumas das principais orquestras mundiais, como a já citada Filarmônica de Berlim.
Outros grandes nomes envolvidos com a interpretação mahleriana e que, de certa forma tiveram suas carreiras alicerçadas na obra do compositor austríaco foram Leonard Bernstein, Otto Klemperer, Bruno Walter, Jascha Horenstein, John Barbirolli, Rafael Kubelik, Bernard Haitink, Georg Solti, Zubin Mehta e Claudio Abbado, para citar alguns dos maestros mahlerianos que deixaram excelentes registros em disco.
Do ponto de vista do ouvinte, o grande atrativo está no imaginativo uso do aparato orquestral, com efeitos instrumentais que ainda fascinam por sua complexidade e pelos resultados alcançados quando bem executados, por exemplo, os compassos finais da segunda sinfonia, o scherzo da quinta sinfonia ou o finale da nona sinfonia. São trabalhos que entusiasmam os amantes da música sinfônica.

Inicialmente, as canções eram para voz com acompanhamento de piano. Algum tempo depois foram orquestradas e rearranjadas, com resultados bastante benéficos, assumindo as feições hoje difundidas.
Em 1889 estreou sua primeira sinfonia, então chamada Poema Sinfônico em Duas Partes, “Titã”, termo extraído da obra literária do escritor romântico Jean Paul, com cinco movimentos. Neste formato a obra não vingou e foi reorganizada, com a exclusão do segundo movimento, Floral (Blumine, em alemão), resultando em quatro movimentos, sendo então batizada de Sinfonia em Ré, editada sem o subtítulo, com o primeiro e o terceiro movimentos baseados em temas já usados em obras de canto anteriores, o segundo uma mistura de valsa com ländler, dança folclórica austríaca, e o último uma mistura de Bruckner com Richard Strauss, densamente orquestrado e com cerca de vinte minutos de duração. A propósito, Mahler não chegou a ser, formalmente, aluno de Bruckner, mas assistia a suas palestras e aulas, além de estudar suas sinfonias e missas.
 A Primeira é a sinfonia mais acessível de Mahler. O primeiro movimento é schubertiano na simplicidade e beleza das melodias empregadas, aproveitando material já anteriormente desenvolvido no Ciclo de Canções Viagens de um Andarilho Errante, de clara inspiração folclórica, sendo desenvolvido sem pressa até quatro minutos antes do fim, quando a orquestra é usada em todo o seu potencial. Mais do que Dvorák, Mahler traz uma festa camponesa para a sala de concertos.
O segundo movimento, como já mencionado, também é em forma de dança, combinando a energia da valsa vienense com a melancolia do ländler, com resultados fascinantes.
A terceira frase é uma marcha fúnebre resignada e insistente combinada com uma melodia judaica, algo irônica, e a quarta soa como se um movimento sinfônico de Bruckner vestisse uma armadura orquestral de Richard Strauss. No último movimento Mahler segue o modelo de seu admirado mestre Bruckner ao citar e desenvolver os temas dos movimentos precedentes, inclusive o tema do BLUMINE, o movimento descartado para dar forma final à composição.
De início a Primeira Sinfonia não foi bem recebida, mas se impôs no decorrer dos anos, principalmente porque não apresenta as complexidades temáticas, estruturais e materiais de algumas das sinfonias posteriores. Pelo contrário. Muitos diretores de orquestras menos equipadas costumam manter em seu repertório pelo menos esta sinfonia.
Mas não devemos nos iludir. As sinfonias que Mahler entregou ao público são mais exigentes técnica e musicalmente do que qualquer obra anterior. É o apogeu da música austro-germânica, sendo o resultado lógico do desenvolvimento da música sinfônica iniciado um século antes por Joseph Haydn, continuado por Ludwig van Beethoven e Franz Schubert, seguindo até Anton Bruckner e concluindo sua trajetória com Gustav Mahler e seus discípulos mais jovens Arnold Schoenberg, Alban Berg e Anton Von Webern, os quais estabeleceram alguns dos principais paradigmas da música erudita no século XX e sempre se referiam a Mahler como influência e inspiração. Um século após a morte de Mahler ainda não se constatou o aparecimento de um novo “titã” sinfônico da envergadura dos mestres acima mencionados, embora o finlandês Jean Sibelius e o soviético Dmitri Shostakovich tenham escritos grandes sinfonias.
Schubert fornece o modelo melódico de muitas obras de Mahler, embora este não seja um mero imitador. Ele tinha a capacidade de reunir diversos ingredientes musicais e empregá-los com resultados originalíssimos. Ele próprio considerava que cada novo estilo adotado exigia uma nova técnica que se adequasse. Por isso suas dez sinfonias, mais a Canção da Terra, destacam-se pela não repetitividade, de forma que nenhuma delas soa como as outras.
 Bruckner é o modelo estrutural: frases imensas e longos desenvolvimentos são características de praticamente todas as sinfonias de Mahler.
A Primeira Sinfonia está fartamente disponível em disco ou download. Por ser a sinfonia mais acessível há muitas gravações competentes, de forma que não é fácil separar as melhores.
A crítica é bastante generosa com a versão de Rafael Kubelik à frente da Orquestra Sinfônica da Radiodifusão Bávara, sediada em Munique, na Alemanha. É considerada uma gravação clássica, realizada em pleno ressurgimento de Mahler como compositor, a partir do final dos anos 50 do século XX. O disco, editado pela Deutsche Grammophon, é complementado pelo ciclo CANÇÕES DE UM ANDARILHO ERRANTE, cantadas pelo barítono Dietrich Fischer-Dieskau.
Citamos também a gravação de Bernard Haitink, regendo a Orquestra Real do Concertgebouw de Amsterdã(Philips, 1971).Esta foi a primeira orquestra a abrir espaço regularmente em seus concertos para as obras de Mahler. Essa tradição perdura até hoje, em concertos e gravações memoráveis, independente de qual maestro esteja na regência, seja Haitink, Riccardo Chailly ou Mariss Jansons, o atual maestro titular. O virtuosismo orquestral resplandece em cada compasso, de forma que esta é uma versão eletrizante da primeira sinfonia, também complementada pelo mesmo ciclo presente na versão de Kubelik, agora na voz do barítono Hermann Prey.
Bastante consideradas são as realizações de Leonard Bernstein, tanto com a Filarmônica de Nova York (Sony Classical) como com a orquestra do Concertgebouw de Amsterdã (DG), esta última reputada como um marco da discografia mahleriana. Aqui Bernstein conseguiu um raro e extraordinário equilíbrio entre o conteúdo emocional e a excelência orquestral (característica também presente na sua gravação da Sinfonia Nº 5 com a Filarmônica de Viena). Talvez a melhor versão disponível.
Não por acaso, Bernstein foi assistente, e eventual substituto, de Bruno Walter, por sua vez discípulo e assistente de Mahler, responsável pelas estréias da Canção da Terra e da Nona Sinfonia, que nos legou preciosas gravações do repertório mahleriano, que nos dão uma idéia da abordagem de Mahler para suas próprias obras. Os discos são hoje editados pela Sony.
Destacamos, ainda, dentre outros, o trabalho de Claudio Abbado, com registros impecáveis desta sinfonia (e de todas as outras), com as Filarmônicas de Viena e de Berlim e a Sinfônica de Chicago. A propósito, este foi o programa de seu concerto inaugural como maestro titular da Filarmônica de Berlim, sucedendo ao falecido Herbert Von Karajan, em outubro de 1989.
As versões de Zubin Mehta e Georg Solti também são excelentes, principalmente as realizadas nos anos 70. Mehta e Rattle produziram versões que reincorporam o movimento descartado, o Blumine, embora muitos sustentem que o material não representa o melhor de Mahler, além de desrespeitar a decisão que o próprio compositor tomou sobre a forma final da primeira sinfonia. Defendemos a opinião de permitir ao público conhecer a obra em sua forma original e que cada ouvinte decida se o tal movimento é digno ou não de ser executado, principalmente pela integração temática realizada no último movimento, onde há várias citações do Blumine.

continua...
JHC

Democracia assembleiana(?)

Embora não congregue mais em uma Assembléia de Deus ( vou a um tabernáculo da Mensagem de William Branham), meu círculo de amizades ainda é composto, em sua maior parte, por crentes assembleianos. Não saí de lá por contendas ou dissoluções que me envolvessem, simplesmente senti desejo de algo mais profundo que o que é hoje vivido naquele meio. Mas, como se trata do bem-estar espiritual de meus irmãos em Cristo, não deixo de me preocupar, o que já era uma característica minha desde o início de minha caminhada cristã.

A pauta do dia, para o bem e para o mal, é a eleição para pastor presidente que ocorrerá no dia 05 deste mês de junho. De um lado, está o atual presidente, em seu enésimo mandato( em qualquer contexto, a reeleição é uma coisa perversa), e do outro, um conhecido pastor setorial. Pela primeira vez, o direito ao voto foi extendido a todos os membros efetivos. Antes, só pastores, presbíteros, diáconos e auxiliares ministeriais votavam.

Disputas são sempre desgastantes e se os candidatos não vigiarem extrapolarão facilmente os limites cristãos para palavras e condutas. Na verdade, parece que estes limites já foram implodidos.

Essencialmente, não tenho nada contra eleição. Sou contra a manipulação e o baixo nível de campanha. O atual presidente é homem idoso, há mais de uma década no cargo. Ora, um pastor segundo as Escrituras (cito especificamente Ezequiel 34 e João 21), deveria colocar o rebanho acima de seu próprio interesse pessoal. No lugar dele, eu me perguntaria: Já não é hora de passar o cetro para outro, com melhores condições físicas e espirituais, pelo bem da Igreja? Avivamento não é amontoar tijolos e concreto. A Igreja não precisa de um renovo? Que balanço se faria do mandato cumprido? Quais as vitórias? Quais as conquistas que ainda precisam ser alcançadas?

Estas mesmas perguntas devem ser aplicadas ao outro candidato. E outra ainda, aos dois: "Por que os senhores desejam tanto a presidência do ministério em Teresina?"

Qual será o resultado disto tudo? A mesma coisa que vimos na CGADB? Intrigas, intrigas e mais intrigas? Lembremos que o "Sr. Presidente" José Wellington Bezerra da Costa excluiu a Igreja em Belém do centenário do qual aquela igreja é o objeto, criando um situação de pura desonestidade intelectual, afinal aquela congregação, chamada de Igreja-Mãe das Assembléias no Brasil, é que faz 100 anos em 2011. Qual a motivação por trás desta postura? Amor? Misericórdia? Boa-vontade? Creio que não.

Até o último dia em que congreguei na Assembléia o que mais chamava a atenção era: disputas por cargos, desrespeito ao pastor, cultos que mais parecem festival de karaokê e ensino mínimo(às vezes, nem isso) da Palavra.

Qualquer um que queira ser pastor tem de atentar para isso.

Citando Ezequiel 34: o pastor deve cuidar do rebanho, tratar das ovelhas feridas, alimentar as famintas, resgatar as desgarradas, livrá-las das feras. Qualquer coisa aquém disso desqualificará o indivíduo, que será apenas um "não-pastor".

J.H.C.

Intenções

Usarei este espaço sempre que sentir necessidade de expressar algum pensamento, seja bíblico, teológico, eclesiástico, artístico ou sobre fatos do cotidiano. Alguém uma vez me disse que percebia, da minha parte, um desejo de comunicar que ia além da simples conversa. Tentarei concretizar esta vontade da melhor forma possível. Não sei se terei leitores, mas, se por ventura você me visitar, sinta-se bem-vindo.